Recentemente, o New England Journal of Medicine publicou um artigo (**[link](https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2513032)**) e um editorial provocador (**[link](https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMe2515057)**) sobre o estudo PISCES, que avaliou suplementação de 4 g/dia de ácidos graxos n−3 em pacientes em hemodiálise. **O achado? Uma redução impressionante nos eventos cardiovasculares — mas com várias ressalvas importantes.**
📚 Referência: McCausland FR, Charytan DM. N Engl J Med. 2025; DOI:10.1056/NEJMe2515057.
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###### **O que sabemos até agora**
• Pacientes em hemodiálise continuam apresentando mortalidade anual de \~18%, principalmente por causas cardiovasculares.
• Estratégias clássicas para proteção CV — estatinas, espironolactona, cinacalcete — não reproduziram benefícios robustos nessa população.
• O **estudo PISCES** trouxe resultados surpreendentes: redução de 43% em eventos cardiovasculares totais, incluindo diminuição de IAM, AVC, morte cardíaca e amputações por doença vascular periférica.
• A intervenção aumentou as concentrações plasmáticas de n−3 PUFA, reforçando adesão e mecanismo biológico plausível.
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###### **Por que os resultados chamam tanta atenção?**
• **Magnitude do efeito**: os intervalos de confiança ficaram amplamente abaixo da neutralidade.
• **Possível efeito anti-inflamatório:** alinhado a resultados positivos de terapias como anakinra e clazakizumab em subestudos de inflamação na diálise.
• **Coerência interna: **os grupos estavam bem balanceados; a amostra representou adequadamente pacientes de HD dos EUA, Canadá e Austrália.
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###### **Mas… devemos recomendar ômega-3 rotineiramente?**
**Apesar da empolgação, os editorialistas reforçam cautela:**
• Grandes efeitos terapêuticos em ensaios iniciais frequentemente não se replicam em estudos posteriores.
• Persistem dúvidas sobre generalização, mecanismos, adesão a longo prazo e diferenças de formulação/dose.
• Pequenos aumentos numéricos em infecções e complicações respiratórias no grupo n−3 exigem investigação adicional — relevante, considerando que infecções são a segunda principal causa de morte na hemodiálise.
• Reguladoramente, um único estudo dificilmente sustenta indicação formal.
📌 **Conclusão do NEJM**: os resultados são encorajadores, mas precisamos de um ensaio confirmatório antes de incorporar amplamente na prática clínica.
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##### **Implicações práticas**
• Discussão aberta com o paciente é essencial — especialmente para aqueles com alto risco CV e baixa tolerância a outras terapias.
• Monitorizar possíveis efeitos adversos, principalmente respiratórios.
• Considerar custo, disponibilidade, pureza do produto e dose efetiva (≥4 g/dia de n−3 PUFA).
• Observar contexto clínico individual, incluindo inflamação crônica e risco cardiovascular basal.
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##### **Conclusão do NefroUpdates**
O estudo PISCES reacende a esperança de uma intervenção segura, barata e potencialmente transformadora na hemodiálise. Mas a história da nefrologia e da cardiologia nos lembra: resultados muito bons exigem confirmação antes de mudar a prática.
Até lá, o ômega-3 pode ser considerado caso a caso — sem excesso de entusiasmo, e com ciência em primeiro lugar.
💡 Para quem acompanha a área, esse pode ser um dos temas mais influentes na nefrologia de 2025.