Referência: Wang Q-R, Wu L, Huang J et al. Clinical Kidney Journal, 2025. [[link](https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/40357496/)]
Caso clínico
Imagine uma paciente de 34 anos, com diagnóstico confirmado de nefropatia por IgA (NIgA), TFGe de 65 mL/min/1,73m² e proteinúria persistente de 0,6 g/g, mesmo após uso otimizado de losartana 100 mg/dia e Dapagliflozina 10mg. Sem critérios para imunossupressão, mas com proteinúria que incomoda e preocupa quelquer um…
💬 Surge a pergunta: vale tentar finerenona para reduzir ainda mais a proteinúria mesmo fora do diabetes?
Essa é justamente a pergunta que o estudo chinês multicêntrico publicado no Clinical Kidney Journal buscou responder.
O que o estudo avaliou?
Foi um estudo observacional retrospectivo com 178 pacientes com NIgA confirmada por biópsia e proteinúria > 0,3 g/g, todos já em uso de inibidores da ECA (iECA) ou bloqueadores dos receptores de angiotensina II (BRA) na dose máxima tolerada por pelo menos 3 meses.
Eles foram divididos em dois grupos:
* iECA ou BRA isolado
* iECA ou BRA + finerenona (10–20 mg/dia)
Acompanharam os pacientes por 6 meses, avaliando a redução percentual da relação proteína/creatinina (PCR) como desfecho primário.
Figure 1: Caracteristicas dos pacientes
O que os resultados mostraram?
A finerenona reduziu significativamente a proteinúria:
* –32,5% no grupo com iECA ou BRA isolado
* –45,1% no grupo com iECA ou BRA + finerenona (P = 0.013)

Além disso:
* Mais pacientes atingiram queda >50% da PCR no grupo com finerenona (63% vs. 36%, P = 0.001)
* 37% dos pacientes com finerenona atingiram proteinúria < 0,3 g/g, comparado a apenas 20% no grupo controle

E o papel dos inibidores de SGLT2?
Quase metade dos pacientes em ambos os grupos usavam SGLT2i (44,9% no grupo iECA ou BRA isolado vs. 46,9% no grupo com finerenona). Isso levanta uma dúvida prática: existe ganho adicional da finerenona mesmo com o uso de SGLT2i?
##### 🔬 O estudo abordou isso diretamente. Entre os pacientes que já usavam SGLT2i:
A queda de proteinúria foi mais intensa com a combinação tripla (iECA ou BRA + SGLT2i + finerenona), chegando a –44,9%, em comparação com –36,7% no grupo com iECA ou BRA + SGLT2i.
Contudo, essa diferença não atingiu significância estatística (P = 0.050), sugerindo que a adição de finerenona sobre um tratamento com SGLT2i pode ter benefício limitado ou individualmente variável.

Discussão
Essa foi uma das primeiras séries clínicas que testaram a finerenona em pacientes com NIgA não diabética, um grupo muitas vezes deixado de lado nos grandes estudos randomizados. A magnitude da redução da proteinúria foi expressiva e clinicamente relevante, alcançando quase 50% em apenas 6 meses com uma droga de perfil favorável de segurança.
Mas como interpretar o dado nos pacientes que já estavam em SGLT2i?
➡️ Os SGLT2i reduzem proteinúria via mecanismos hemodinâmicos e metabólicos (↓ pressão intraglomerular, ↓ reabsorção tubular de sódio).
➡️ Já a finerenona atua de forma distinta: efeitos anti-inflamatórios e antifibróticos mediados pela inibição do receptor de mineralocorticoide.
Teoricamente, isso abriria margem para um efeito sinérgico, mas o estudo sugere que essa sinergia pode não ser aditiva, ao menos no curto prazo e com amostra pequena de pacientes. A diferença entre os grupos com e sem finerenona em uso de SGLT2i foi no limite da significância, e o benefício marginal pode depender do perfil do paciente, como grau de fibrose ou intensidade da lesão mesangial.
##### Segurança

* Hipercalemia: discreta (+0,17 mmol/L), sem casos incontroláveis
* TFGe: variação leve e não significativa
* Apenas 6 pacientes descontinuaram a medicação por aumento da creatinina > 30%
* Nenhum evento adverso grave atribuído diretamente à finerenona
Opinião do NefroAtual
Este estudo traz uma alternativa interessante na prática clínica: usar finerenona em pacientes com NIgA com proteinúria persistente e TFGe preservado, como uma estratégia não-imunossupressora para intensificar o controle da proteinúria naqueles já otimizados para o tratamento conservador. Mesmo em pacientes usando SGLT2i, a finerenona parece segura, e pode contribuir na redução da proteinúria, embora seu impacto incremental seja menos claro.
Fica a expectativa para o estudo FIND-CKD, que trará dados randomizados e com desfechos duros com finerenone em pacientes não diabéticos que deve incluir pacientes com NIgA
E você?
Já tentou usar finerenona em um paciente com NIgA fora do cenário diabético? Já teve pacientes com uso conjunto de SGLT2i?
Conta pra gente nos comentários como tem sido a sua experiência!