Referência:
Vargas-Brochero MJ, et al. An proteinuric effect of SGLT2 inhibitors in non-diabetic glomerulopathies is dependent on body mass index. Nephrol Dial Transplant. 2025. \[**[link](https://academic.oup.com/ndt/advance-article/doi/10.1093/ndt/gfaf197/8263928?login=false)**]
###### **Caso clínico**
Homem de 44 anos, IMC 22 kg/m², com nefropatia por IgA diagnosticada por biópsia. Proteinúria de 2,0 g/24h, TFGe de 60 ml/min/1,73m², em uso otimizado de losartana 100 mg/dia. Você inicia dapagliflozina esperando uma queda da proteinúria de pelo menos 30%.
Três meses depois, a TFGe segue estável e a proteinúria permanece em 1,9 g/24h. Nenhum benefício claro.
Já um colega do mesmo ambulatório prescreveu dapagliflozina para outro paciente, semelhante em idade e diagnóstico, mas com IMC 32 kg/m². Em seis meses, a proteinúria despencou para 1,1 g/24h.
###### **Isso é por acaso? O que explica essa diferença? Será que o IMC pode modular a resposta ao iSGLT2?**
###### **O que o estudo avaliou?**
• **Tipo:** estudo multicêntrico retrospectivo, observacional.
• **Período**: 2016–2023.
• **População**: 300 pacientes, todos não diabéticos e com glomerulopatias comprovadas por biópsia, proteinúria >0,5 g/dia e em uso de bloqueio do SRAA otimizado.
•** Cenários**: Espanha, Itália e Estados Unidos (Mayo Clinic).
• **Doenças mais comuns:**
1. o Nefropatia por IgA (40,3%)
2. o GESF (35,7%, incluindo primária, secundária e genética)
3. o Outras: membranosa, lúpus, GNC3 etc.
###### **Principais achados**
**1. Resposta antiproteinúrica depende do IMC:**
* IMC \<25 (magros): apenas 31,6% tiveram resposta (queda ≥30% da proteinúria).
* IMC 25–29,9 (sobrepeso): 64,5% responderam.
* **IMC ≥30 (obesidade): 66% responderam.**
* **Risco relativo de resposta:** 2 vezes maior nos grupos sobrepeso/obesidade.
**2. Queda de TFGe (o famoso “drop” inicial):**
* Não foi observada nos pacientes com IMC \<25.
* Foi significativa nos obesos (queda média de \~5 ml/min em 6 meses).
**3. Redução de proteinúria:**
* Sobrepeso: -0,7 g/24h em 6 meses.
* Obesos: -0,71 g/24h.
* Magros: redução mínima (-0,15 g/24h, p=ns).
**4. Pressão arterial e peso:**
* Reduções discretas de PAS e peso foram vistas principalmente nos obesos.
* Magros não tiveram redução significativa de pressão, peso ou IMC.
##### **Por que isso acontece?**
O mecanismo parece estar ligado ao estado de expansão volêmica e hipertensão capilar glomerular:
• Em obesos/sobrepeso → há maior reabsorção de sódio, ativação do SRAA, hiperfiltração glomerular.
• O iSGLT2 reduz essa sobrecarga hemodinâmica → queda da pressão intraglomerular e da proteinúria.
• Em magros → sem volume expandido, o efeito é mínimo.
• Isso explica porque não há drop inicial de TFGe nem queda consistente da proteinúria em pacientes de baixo IMC.
###### **O que muda para o nefrologista na prática?**
• Pacientes magros, não diabéticos, com glomerulopatia: não espere grandes reduções da proteinúria com iSGLT2. Isso não significa que não devam usar, mas os benefícios antiproteinúricos podem ser limitados.
• Pacientes com sobrepeso ou obesidade: aí sim, os iSGLT2 mostram todo o potencial antiproteinúrico.
• Personalização: em tempos de medicina de precisão, o IMC pode ser uma variável simples e prática para prever a resposta.
• **Questão em aberto:** será que em magros, mesmo sem redução da proteinúria, os iSGLT2 trazem benefícios cardiovasculares ou de longo prazo? Essa resposta ainda não temos.

###### **Mensagem final do NefroAtual**
Nem todo paciente responde igual ao iSGLT2. O IMC importa, e muito. O benefício antiproteinúrico parece restrito a quem tem sobrepeso ou obesidade.
👉 E você, já percebeu no consultório essa diferença de resposta entre pacientes magros e obesos? Como isso muda sua decisão de prescrever iSGLT2 em glomerulopatias não diabéticas?